segunda-feira, 21 de maio de 2018

Brasileiros serão julgados em SP por matar no Japão a mando da Yakuza

14/09/2016

Dois descendentes de japoneses fugiram para o Brasil após crimes em 2001.

Contratados pela máfia japonesa mataram homem e tentaram asfixiar mulher.

Kleber Tomaz e Glauco Araújo


Do alto à esquerda para a direita, em sentido horário: tatuagem; fotos e nomes dos réus; projéteis de arma usada para matar em Tóquio; desenho de testemunha sobre tatuagem (Foto: Reprodução / Divulgação)Do alto à esquerda para a direita, em sentido horário: tatuagem; fotos e nomes dos réus; projéteis de arma usada para matar em Tóquio; desenho de testemunha sobre tatuagem (Foto: Reprodução / Divulgação)
A Justiça de São Paulo julga nesta quarta-feira (14) dois brasileiros, descendentes de japoneses, que estão presos preventivamente acusados de assassinar a tiros um homem e de tentar matar a mulher dele por asfixia há 15 anos no Japão. Segundo a acusação, a máfia japonesa Yakuza foi a mandante.
Os crimes ocorreram em 4 de junho de 2001, em Tóquio, tendo repercussão na imprensa do país asiático devido à violência. O julgamento está marcado para começar às 10h30 no Fórum Criminal da Barra Funda, na Zona Oeste da capital paulista.
De acordo com a acusação, Cristiano Gonçalves Ito, o Javali, atualmente com 39 anos, e Marcelo Chrystian Gomes Fukuda, de 36, foram contratados por 3 milhões de ienes cada um (cerca de R$ 71 mil à época) para invadir a casa do comerciante japonês Yoshitaka Kawakami e matá-lo. Eles achavam que o homem estava sozinho.
Três disparos foram feitos, mas Yoshitaka foi morto com dois tiros. A mulher dele, a japonesa Naomi Kawakami, estava no local e foi agredida com o cabo da arma. Os brasileiros não queriam que ela testemunhasse contra eles. Ainda tentaram asfixiá-la e ela caiu desacordada.
Cristiano e Marcelo fugiram do local e dois dias depois embarcaram num voo para o Brasil com a ajuda da máfia japonesa, segundo o Ministério Público (MP) de São Paulo.
Os brasileiros, no entanto, não sabiam que Naomi tinha se fingido de morta e sobrevivido. Ela deu pistas à polícia japonesa, que em 2003 identificou, prendeu e condenou à prisão perpétua o mandante do assassinato: o irmão gêmeo de Yoshitaka, Ikebe Tetsuo.
Yakuza
Ao todo, oito pessoas participaram dos crimes no Japão. Segundo a investigação, Ikebe contratou a Yakuza para matar o irmão porque não aceitava o fato de ter sido criado pelos avós, enquanto Yoshitaka cresceu com os pais.
YAKUZA (Foto: Reprodução / Divulgação)Da esquerda para a direita: página do processo feito no Japão é traduzida para o português ao lado; nas imagens policiais investigam o quarto do casal atacado pelos brasileiros, no chão estão marcas de sangue das vítimas (Foto: Reprodução / Divulgação)
Outras cinco pessoas que tiveram participação no crime, sendo três japoneses e outros dois brasileiros, foram presas no Japão e condenadas à prisão e trabalhos forçados. Todos confessaram envolvimento.
Após pedido das autoridades japonesas, a Interpol e a Polícia Federal (PF) prenderam Cristiano e Marcelo em 4 de outubro de 2011. Os dois estavam no interior de São Paulo. Cristiano foi encontrado em Mogi das Cruzes e Marcelo em Campinas.
Em depoimentos, eles confessaram os crimes em Tóquio. Disseram ainda que só receberam metade do valor combinado pela execução.
Como os brasileiros foram detidos no Brasil por um crime cometido no Japão, e não há acordo de extradição entre os países, eles foram processados por homicídio qualificado e tentativa de assassinato e serão julgados por esses crimes em território brasileiro.
Promotor José Carlos Cosenzo (Foto: Kleber Tomaz / G1)Promotor José Carlos Cosenzo espera que a Justiça condene os brasileiros a pena máxima (Foto: Kleber Tomaz / G1)
Julgamento
Sete jurados no Brasil irão decidir se a dupla brasileira deve ser considerada culpada pelos crimes e se será condenada.
O promotor José Carlos Cosenzo, representante do MP responsável por acusar Cristiano e Marcelo, espera que os brasileiros sejam condenados e recebam penas máximas de prisão. Pela lei brasileira, ninguém pode ficar detido mais de 30 anos.
"Os réus são confessos e o trabalho da investigação japonesa, em colaboração com as autoridades brasileiras, conseguiu identificar os culpados pelos crimes", disse Cosenzo ao G1, que recebeu os mais de 20 volumes do processo diretamente do Japão. O conteúdo teve de ser traduzido do japonês para o português.
A prisão e julgamento dos brasileiros teve repercussão na imprensa do Japão. Segundo a assessoria de imprensa do Tribunal de Justiça (TJ) de São Paulo, cinco jornais japoneses entraram em contato para pedir informações sobre o julgamento: NHK, Jiji Press, Nikkey Shinbun, Yomiuri Shinbun e Kyodo News. Três deles deverão compararecer ao júri.
Representantes do consulado japonês, em São Paulo, também poderão estar presentes no plenário durante o júri. Como apenas uma testemunha de defesa deverá falar, a sentença do juiz deverá ser conhecida no mesmo dia. As demais testemunhas já haviam sido ouvidas pela Justiça do Japão.
YAKUZA (Foto: Reprodução / Divulgação)Ilustrações feitas por peritos japoneses mostra onde tiros atingiram comerciante japonês (Foto: Reprodução / Divulgação)
Apesar de Cristiano possuir uma tatuagem que remete a letra ¨Y¨ na nuca, o que para a Promotoria significa que ele é membro da Yakuza, o réu negou pertencer a máfia japonesa quando foi ouvido pela Justiça brasileira.
Como a defesa de Cristiano renunciou há cerca de um mês do julgamento, um defensor público deverá ser nomeado pelo juiz para defendê-lo.
Procurado pelo G1, o advogado Caio Cesar Arantes, que defende Marcelo, afirmou que irá pedir aos jurados para inocentar seu cliente do crime de tentativa de assassinato da esposa do comerciante.
"Marcelo confessou ter dado o segundo tiro na vítima, o fatal, mas nega ter tentado matar a mulher", falou Caio. "Ele está bastante arrependido".
Relatório da polícia japonesa traduzido para o português aponta nomes dos brasileiros acusados de matar comerciante e de tentar matar a mulher dele em Tóquio (Foto: Reprodução / Divulgação)Relatório da polícia japonesa traduzido para o português aponta nomes dos brasileiros acusados de matar comerciante e de tentar matar a mulher dele em Tóquio (Foto: Reprodução / Divulgação)
Os crimes
De acordo com a acusação, Ikebe procurou Urayama Tetsuji, da Yakuza, para matar Yoshitaka. Urayama então chamou Kanesaka Masafumi, também ligado à máfia japonesa, para ajudar. Para não deixar rastros do crime, este achou melhor que o crime fosse feito por um estrangeiro, que poderia fugir do Japão em seguida.
Kanesaka pediu para o brasileiro Marcos Yura, o Valti, encontrar quem poderia assassinar o irmão de Ikebe. Combinaram o valor de 3 mil ienes pelo serviço. Marcos então contratou os brasileiros Denis Yuji, Cristiano e Marcelo.
Denis foi acusado no Japão de ter levado Cristiano e Marcelo de carro até a casa das vítimas, que dormiam.
Além dessas sete pessoas citadas acima pelo MP, Shimura Yashiro também participou do crime por ter levado Kanesaka a Tóquio e emprestado seu celular para ele falar com o grupo criminoso.
A Yakuza foi fundada por volta do ano 1.600. É conhecida mundialmente como a mais famosa organização criminosa do Japão. Tráfico de drogas, extorsões, prostituição, pornografia são algumas das suas atividades.
Peritos japoneses desenharam a arma usada no crime (Foto: Reprodução / Divulgação)Peritos japoneses desenharam a arma usada no crime (Foto: Reprodução / Divulgação)
Brasileiro condenado
Na última sexta-feira, a Justiça de São Paulo condenou a 56 anos, nove e dez dias de prisão em regime fechado um homem acusado de matar a namorada e os dois filhos dela no Japão em dezembro de 2006. Edilson Donizete Neves foi julgado no Fórum da Barra Funda.
Pelo fato de ser brasileiro e ter sido detido em 2013 no Brasil, ele não foi extraditado.
Edilson foi condenado pelo crime de triplo homicídio, por motivo torpe e meio cruel cometido na província de Shizuoka contra Sônia Misaki e os filhos dela, um deles tinha menos de 14 anos. A condenação foi decidida por um júri popular, formado por sete pessoas. A pena foi dada pelo juiz Roberto Zanichelli Cintra, da 1ª Vara do Júri

G1

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