A Statoil e a corrupção em Angola, por William Nozaki
A Noruega e a Angola são países que ocupam lugares diametralmente opostos nos rankings de transparência internacional, enquanto os nórdicos figuram nas listas dos países com melhor governança estatal e empresarial cabe aos africanos o posto de país elencado nas listas dos mais corruptos e com ambiente de negócios altamente permeável à porta giratória entre Estado e mercado.
Tal diferença, entretanto, não impediu que os dois países aparecessem lado a lado figurando como cúmplices em uma investigação anti-corrupção envolvendo as grandes petrolíferas Statoil, hoje com o nome de Equinor, e Sonangol.
Segundo investigações conduzidas pelas autoridades européias, a Statoil teria pago cerca de 500 milhões de Euros para ter acesso às licenças de exploração e produção ao longo da costa de Angola, além disso outros 81 milhões de Euros seriam usados para diferentes investimentos sociais e tecnológicos, com destaque para a construção de um centro de pesquisa, qualificação, desenvolvimento e inovação. Os montantes teriam sido pagos à Sonangol, entretanto os recursos não teriam sido utilizados para suas finalidades contratadas.
Os primeiros indícios de desvio desses recursos começaram a surgir em 2013, quando outras empresas do setor como a BP inglesa, a Total francesa e a Repsol espanhola se associaram à Statoil para mobilizar um fundo de financiamento que atingiu cerca de 400 milhões de dólares para a constituição do referido centro de pesquisas.
A despeito do valor expressivo recebido pela Sonangol angolana, o centro não chegou a ser construídos e os registros do projeto, ao que tudo indica, desapareceram. Esse núcleo de P&D deveria ter sido construído na cidade de Sumbé, onde está sediado o Instituto Nacional do Petróleo, mas ao contrário do que se imaginou, provavelmente, o projeto era apenas um pretexto para a operacionalização de negociatas em torno de licitações, concessões e regulações das reservas de óleo e gás angolanas.
A situação veio à tona apenas depois da Statoil e da BP tornarem o caso público em seus balanços anuais e depois de o governo Angolano recorrer ao FMI para um pedido de ajuda financeira, o que colocou a Sonangol debaixo de uma fiscalização mais atenta por parte dos organismos financeiros internacionais.
As investigações desse caso remetem a um outro escândalo de corrupção envolvendo dessa vez o vice-presidente angolano e ex-presidente da Sonangol, Manuel Vicente, e o ex-procurador do departamento central de investigação e ação penal de Portugal (DCIAP), Orlando Figueira. O magistrado português teria recebido algumas parcelas para arquivar investigações de crimes de colarinho branco e de organização criminosa internacional contra o político angolano de alta patente.
Os montantes utilizados no suborno também seriam referentes a projetos financiados, mas nunca executados pela empresa Sonangol e pelo governo Angolano, indicando um possível modus operandi da elite econômica e política daquele país.
Se por um lado é verdade que a economia angolana é uma das mais opacas em termos de publicização e transparência nas contas públicas, por outro lado também é correto que as grandes petrolíferas internacionais muitas vezes zelam pela boa governança em seus países de origem, mas atuam ao arrepio da lei nos países periféricos.
Tanto as International Oil Companies (petrolíferas privadas de atuação global, IOCs), como a BP e a Total, como as National Oil Companies (petrolíferas estatais de atuação global, NOCs), como a Statoil, não estão imunes ao fato de que a indústria mundial de petróleo é uma das mais expostas aos casos de investigações envolvendo corrupção ativa ou corrupção passiva, não se trata de um problema empresarial endêmico, mas de um problema setorial sistêmico, dados os interesses geopolíticos e políticos e os volumes de contratos e recursos movimentos por esse setor. O combate à corrupção no setor petrolífero não comporta simplificações e moralismos.
William Nozaki é professor da Fundação Escola de Sociologia e Política de São Paulo. Possui graduação em Ciências Sociais pela USP e mestrado em Economia pela UNICAMP onde realiza o doutorado em Desenvolvimento Econômico. Atua nas áreas de economia política e brasileira pesquisando temas como crescimento econômico, concentração de riqueza e distribuição de renda.
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